Histórias de quem era criança nos anos 1940 servem de matéria-prima para o documentário Sem Palavras, de Kátia Klock, que será exibido nesta quinta-feira, 23 de julho, às 20h30, no Centro Cultural 25 de Julho, em Blumenau. Realizado pela Contraponto, o documentário aborda um período polêmico da história brasileira, os efeitos provocados pela Campanha de Nacionalização de Getúlio Vargas (1937-1945), um conjunto de ações que deixou amargas lembranças. Sem Palavras teve até agora 13 exibições com uma plateia de 2000 pessoas. O documentário, que reforça a programação dos 180 anos da imigração alemã de Santa Catarina, será distribuído em breve em DVDs para escolas e bibliotecas catarinenses e instituições culturais do país e exterior.
Quando o Brasil entrou na Segunda Guerra Mundial com os Aliados, em 1942, os idiomas alemão, italiano e japonês tornaram-se proibidos no país e estes estrangeiros e seus descendentes começaram a ser perseguidos. O documentário de 52 minutos faz um recorte sob a ótica das lembranças e narrativas orais dos descendentes de origem alemã. A equipe entrevistou moradores de Blumenau, Vila Itoupava, Pomerode, Balneário Camboriú, Joinville, Jaraguá do Sul, Brusque, Jaraguá do Sul e Florianópolis, locais em que também teve acesso a arquivos públicos e privados. O trabalho reúne fotografias e arquivos sonoros, revelando uma criteriosa pesquisa.
Sem Palavras reconstrói o clima da época com cenas dramatizadas. As encenação foram realizadas com pessoas que não são atores, e sim descendentes de famílias alemãs de Blumenau. A trilha sonora é outro detalhe bem afinado no documentário. O maestro brusquense Edino Krieger cedeu gentilmente composições para o documentário. Ficou a cargo do trilheiro Ricardo Fujii montar a trilha final. A finalização do documentário é assinada por Paulo Calasans, que montou ao lado da diretora e do produtor executivo Mauricio Venturi.
Sentimentos à flor da pele
Com um olhar plenamente mergulhado na contemporaneidade, que mescla memória, história, cultura e identidade, Kátia Klock mexeu em sentimentos para costurar o documentário. A partir de revelações e lembranças pessoais, o objetivo foi construir narrativas orais e resgatar dados históricos para estimular reflexões sobre o passado e o presente. Os álbuns fotográficos das famílias ajudaram a motivar os entrevistados a relembrar episódios do tempo da Segunda Guerra.
?Investigamos histórias vividas por descendentes de alemães no Estado, quando foram proibidos de falar outra língua em território nacional que não fosse o português. Nesta época existiram 12 presídios no país que eram denominados ?campos de concentração?. Dois ficavam em Santa Catarina, Florianópolis e Joinville, para onde eram levados alemães e descendentes sob suspeita aos olhos dos generais brasileiros. A perseguição marcou muitas família?, conta Kátia, que, em Blumenau, entrevistou pessoas que contribuíram com suas memórias e histórias que envolvem política, cultura, educação, família e pátria.
Sem Palavras apresenta um dos lados da história através das memórias de quem era criança e descendente de alemão na época da Segunda Guerra Mundial em Santa Catarina. O medo, o silêncio, o drama das perseguições e seus efeitos são visíveis e ainda presentes para quem vivenciou o momento. Inquietudes e reflexões são sentimentos que a equipe do documentário espera provocar ao abordar um tema sobre a perda da liberdade em virtude de uma ditadura. Os traumas são tão reais quanto o governo militar.Prêmio Cinemateca
Em 2007, o governo do Estado, por meio da FCC, contemplou 13 projetos pelo Prêmio Cinemateca Catarinense/FCC, totalizando um valor de R$ 1,6 milhão. Sem Palavras foi contemplado na categoria documentário média-metragem com R$ 100 mil para a produção. Este edital é o principal mecanismo de incentivo ao audiovisual que já existiu no Estado e tem ajudado a impulsionar a atividade e a gerar novas possibilidades para a criação autoral.
O documentário Sem Palavras baseia-se em pesquisas realizadas no Arquivo Histórico de Joinville, no Arquivo Histórico de Blumenau, entre outros, bem como em estudos acadêmicos, como Tempo de Lembrar, Tempo de Esquecer, tese de doutorado de Janine Gomes da Silva, da Universidade Regional de Joinville (Univille), defendida em 2004 no curso de história da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O livro Memórias de uma (outra) guerra, da historiadora Marlene de Fáveri, e os romances O guarda-roupa alemão, de Lausimar Laus, e No Tempo das Tangerinas, de Urda Klueger, também serviram de pesquisa e inspiração.