A Fundação Catarinense de Cultura (FCC) promove, até 13 de abril, duas grandes exposições no Museu de Arte de Santa Catarina (Masc). Enquanto a mostra "O Espaço Pleno" reúne dezenas de telas em grandes dimensões de Rubens Oestroem, as instalações da mostra "Invisibile" apresentam algumas reflexões sobre o feminino feitas por três artistas: Letícia Márquez, Lúcia Misael e Maria Cheung.
Amigas há muitos anos, as três artistas pela primeira vez fazem uma exposição conjunta. Todas moram no Paraná, mas em cidades diferentes - Curitiba, Foz do Iguaçu e Londrina. Uma vez por ano, se encontram para falar sobre arte e sobre a vida. Num desses encontros, surgiu a idéia de uma exposição conjunta sobre as mulheres. "Queríamos falar sobre aquilo que não está tão visível, que nos incomoda, mas que muitas vezes deixamos passar", afirma Lúcia. O resultado foi uma exposição intensa, onde força e fragilidade se mesclam.
Na instalação "Alguma coisa acontece no meu coração", de Letícia, o visitante é surpreendido por dezenas de fotos de cabeças de mulheres coladas no alto das paredes, sem corpo, tendo como único adereço vastas cabeleiras desenhadas em grafite até o chão, se equilibrando como grandes totens, parecendo buscar sustentação. Os rostos são de mulheres que fazem parte do dia-a-dia de Letícia - incluindo ela mesma, mais Lúcia e Maria. Todas olham para o alto. Será que buscam socorro, proteção? Será que estão suplicando, ou agradecendo? Não estariam simplesmente fazendo alguma adoração, contemplando algo? "é uma obra aberta. Cada um pode fazer a sua leitura, inclusive entendê-las como seres assexuados, sem corpos, representando questões existenciais", avalia.
Ao lado, nova surpresa. A chinesa/brasileira Maria - cujo nome de nascimento é Miu Kuen, que significa beleza e delicadeza em cantonês - fala da dor das milhares de meninas chinesas mortas antes de nascer, pelo único crime de serem mulheres e não homens. Sua instalação coloca na parede, em pequenas cadeiras, dezenas de bonecos, todos homens e sem roupa, pintados de dourado. Ao lado, pequenos caixões cor-de-rosa guardam chupetas, sapatinhos de bebê, bicos, brinquedos, bonecas. Eles valem ouro, elas valem nada.
Por fim, chegamos nas instalações de Lúcia, cuja fonte de inspiração veio de duas mulheres, suas avós. Sua avó materna morou com a família até morrer. Era dentista e grande bordadeira. Com seu trabalho manual, ajudou a sustentar seus filhos. "Era uma pessoa recatada, mas de muita sensibilidade", conta a artista. Na instalação, Lúcia usa uma das toalhas feitas pela avó. Ela é projetada como sombra no chão, fazendo com que o público receba a imagem em seu corpo. "Da convivência com essa avó, nasceu meu olhar sensível e atento para as pequenas coisas que fazem parte do universo feminino", conta.
Com a avó paterna a convivência foi mais difícil por causa da distância. "Ela morava em uma fazenda no sertão do Piauí, e foi mãe de 16 filhos. Era pequena, mas muito forte. Comandava a casa com muita alegria e propriedade. Tinha um carinho por todos e era muito respeitada e admirada. Nas horas vagas, fazia renda, oficio que aprendeu com sua mãe, para trazer beleza ao seu espaço. Enquanto trabalhava os bilros em suas mãos, organizava o pensamento e se enchia de prazer. Era um momento dedicado a si mesmo", recorda Lúcia. Na instalação, ela usa 521 grandes bilros em vidro, feitos um a um, e que receberam cordões de cobre, reunidos em grupos.
A terceira instalação de Lúcia é uma mesa de vidro que recebeu 60 pequenas toalhinhas feitas de pão. O material foi escolhido pela delicadeza e fragilidade. "é da cultura árabe, chamado de pão toalha. Num único gesto, uma bola de massa é atirada sobre uma superfície côncava que está sobre o calor do fogo. A massa se espalha formando uma fina camada de mais ou menos 30cm de diâmetro. Em seguida são colocadas, ainda quentes, umas sobre as outras para depois receber a embalagem. Ressecam em contato com o ar, portanto a tarefa tem que ser rápida. Imaginem a beleza dessa imagem, empilhando dezenas de placas muito finas de pão, ainda com o calor do fogo".
Pela primeira vez, o Museu de Arte de Santa Catarina abriga uma extensa mostra do trabalho do artista Rubens Oestroem. Da primeira vez, reuniu as obras que realizava sob o influxo do neo-expressionismo germânico, um dos tópicos mais relevantes dos anos 80. No presente momento, o artista, que também é curador da exposição, reúne boa parte de sua produção posterior, relativa sobretudo aos anos 90 e aos primeiros do novo século. Servindo-se de um critério menos histórico do que estético, e interessado em valorizar a presença relacional das obras num espaço museográfico, Rubens deixa claro aos olhos do visitante a extensa problemática criativa que o tem preocupado nos últimos tempos, e que tem nas implicações da materialidade seu mais relevante aspecto. Trabalha com os limites, as rupturas e as possibilidades transpositivas da pintura.
O QUê: Exposições "O Espaço Pleno", de Rubens Oestroem, e "Invisibile", de Letícia Márquez, Lúcia Misael e Maria Cheung.
QUANDO: Visitação até 13 de abril, de terça a domingo, das 13h às 21h.
ONDE: Fundação Catarinense de Cultura / Museu de Arte de Santa Catarina, localizado no Centro Integrado de Cultura (CIC), Av. Gov. Irineu Bornhausen, nº 5600 - Agronômica - Florianópolis - SC. Telefone: (48) 3953-2300.
QUANTO: gratuito.